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Texto: Elton Pila

Foto: Ricardo Franco

Edição 76 Nov/Dez| Download.

Eram muitos rinocerontes

As nuvens pareciam imitar a coreografia das águas de um rio revolto a pedir por mais terra, como se cedesse ao peso dos hipopótamos. A princípio, vimos apenas um com o focinho à superfície, antes de se deixar cobrir pelo lençol de água. Emergiu, como se fosse o milagre da multiplicação, com uma manada. Em horas de safari, atravessaríamos ou veríamos o nosso caminho atravessado também por elefantes, búfalos, bois-cavalos, girafas, impalas, waterbucks e uma infinidade de aves a que as cores sugerem os nomes. Mas nada de rinocerontes. E perceberíamos o porquê à entrada do Zero Alpha, a sede anti-caça furtiva do Sabié Game Park.

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Eram muitos rinocerontes. Agora, só crânios tingidos pelo buraco negro da morte. É o Homem no seu pior, como se se quisesse impor como o único senhor do universo. Nas guerras, sobretudo na guerra-civil – para o caso de Moçambique, as armas disparadas contra homens também eram disparadas contra animais e abriam espaço para que as armas sempre disparadas contra animais introduzissem a caça furtiva. E reduziu à beira da extinção a população de rinocerontes. O que explica muito não os termos visto. É como se, na experiência diária de morte, aprendessem a forjar caminhos que os colocassem distantes da mancha humana. “Os rinocerontes já não mostram um desenvolvimento normal”, anota Kevin Aron, Gestor Geral do Sabié Game Park, um dos poucos parques/reservas que conta ainda com rinocerontes. Di-lo por experiência. “Antes, assim que se sentissem confortáveis, tinham a tendência de permanecer num único território”.

Mas a caça furtiva colocou-os em permanente movimento. E a Savana como um complexo organismo se vai ressentindo da ausência deste mamífero que também ajuda no equilíbrio do ecossistema. “O rinoceronte ajuda a criar a biodiversidade da savana. Quer a comer o capim, quer como hospedeiros de mini parasitas e carrapatos que alimentam pássaros, quer na abertura de poças que retêm água”, diz-nos Aron. É também por aqui que chega a asserção: proteger o rinoceronte também representa a proteção de todo o ecossistema. E esta proteção faz-se com os homens e mulheres do Parque e das comunidades circunvizinhas. “As comunidades são os primeiros guardiões das reservas e parques”, diz Marcelino Foloma, gestor de Programa de Fauna da WWF. Mas também com cães treinados a identificar o rasto dos caçadores furtivos. Vimos um dos treinos desta espécie de obstinada guarda-canina, a fazer do focinho um paciente detector de balas.

Na certeza de que o rinoceronte morre pelos chifres, alguns parques já começaram a tomar iniciativa de descorná-lo por mãos próprias. “É uma decisão muito triste. Mas é perceptível, foi a forma encontrada para salvar a espécie”.

Eram muitos rinocerontes. Agora, só crânios tingidos pelo buraco negro da morte.

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