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Texto: Emanuel Banze

Foto: Mário Cumbane

Edição 80 Jul/Ago/ Set| Download.

Saquia Rachid – “Tufo é alegria”

Ama os palcos, pois vê neles uma janela aberta para o mundo. A partir da Mafalala, numa casa de madeira e zinco, Saquia Rachid sonha levar o tufo o mais longe possível. De sorriso fácil e olhar sempre simpático, esta mulher conserva, no corpo e na alma, marcas que denunciam as origens emakhuwa.

A começar pela capulana, companheira de longa data. Colorido e cheio de traços, o tecido é a primeira escolha na hora de decidir o que vestir, momento em que também não faltam as jóias e as bijuterias, o m’siro e outros elementos que dão realce à beleza e fibra da muthiana orera (“mulher bonita”, em emakhuwa).

Enquanto fala, reajusta o nó do turbante de capulana sobre a cabeça. Na voz, soam melodias e cantares que servem de terapia para afugentar fantasmas e maus espíritos.

“O tufo é para se gingar. Não se pode cantar ou dançar com rugas no rosto”, explica, a revelar que encontra, no ritmo, um espaço para se libertar. “No tufo, você tem que desabafar tudo o que há no coração, tirar toda a maldade do pensamento e gingar para mostrar às pessoas que está a dançar por livre e espontânea vontade. Tufo é alegria”.

Pela mesma vontade, assumiu a liderança do Tufo da Mafalala, há mais de 25 anos. O agrupamento é, hoje, composto, exclusivamente, por mulheres, mas já contou com homens nas suas fileiras. “As coisas estão a mudar. Na época, quem dançava o tufo, aqui na Mafalala, eram os homens. Era assim mesmo em Nampula”, recorda, a contar que é das mãos de um homem que recebeu a responsabilidade de liderar um dos mais antigos conjuntos de música em Moçambique ainda no activo.

“O Tufo já tem mais de 50 anos e é uma herança que ganhei do meu falecido sogro. Ele dançava, cantava e até saltava à corda. Era um homem alegre, feliz e que não tinha vergonha”, lembra com nostalgia e resignação. “Ele se foi e deixou o Tufo para mim”, conforma-se.

À frente do grupo, Saquia Rachid alcançou patamares impensáveis. Rodou o mundo e fez ecoar o tufo em diversos palcos. Actuou em Milão (Itália), nas Ilhas Reunião, no Festival Bushfire (Essuatíni), além de diversas apresentações em solo pátrio, sendo a destacar a mais recente no Festival Azgo. “Subo ao palco sem tristeza, para cantar, dançar e mostrar tudo aquilo que eu sei”, avança.

O próximo passo é o lançamento do primeiríssimo CD, ainda este ano. O projecto já tem forma e nome. Chama-se “Hodi Mafalala” para sintetizar o percurso do grupo, sua ligação com o histórico bairro, bem como o seu posicionamento no panorama artístico e cultural do país.

“Significa que o Tufo está aqui, na Mafalala, onde foi fundado, aberto para conversar e contar a sua história”, explica, a detalhar que o momento, para o grupo, é de superação e festa.

“Nunca imaginei que poderíamos, um dia, gravar um álbum, um videoclipe ou uma música, mas já chegou o tempo de mostrarmos que o Tufo da Mafalala é capaz”.

Neste projecto, o som e a voz (temperada pelas cordas de influência Swahili) cantam o amor, celebram a beleza e enaltecem a força da mulher, ao mesmo tempo em que percorrem a moralidade e outras sensações do dia-a-dia, sem se desfazer do seu estilo característico.

Trata-se da primeira experiência do Tufo da Mafalala em estúdio, longe dos habituais concertos ao vivo e performances em celebrações sociais. Por isso, é, para o conjunto, um grande desafio, assumido com a missão de nele incluir mensagens apelativas a respeito de diversos acontecimentos do dia-a-dia da sociedade.

Edição 80 Jul/Ago/ Set| Download.

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