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Texto: Elton Pila

Foto: Jay Garrido

Edição 65 Jan/Fev | Download

Um caleidoscópio chamado Bazaruto

Quando chegamos ao topo das dunas, estamos a 37 km da planície, com uma visão privilegiada do horizonte.

O horizonte a partir da costa de Vilankulo não nos permite distinguir onde termina o mar e começa o céu, como se fossem extensões um do outro. O azul no longo lençol que se estende à nossa frente torna material a imagem amar sobre o Índico sugerida pelo poeta Eduardo White.

Ainda a âncora repousa no fundo do mar, quando o comandante faz o aviso à navegação: “pelo caminho, podemos avistar golfinhos e tartarugas. Avisem, caso vejam, para que paremos”. Então seguimos viagem de olhos esbugalhados, sempre em alerta, para ver este espectáculo que são os golfinhos em piruetas e as tartarugas com as carapaças no limite do mar.

Os pequenos focos de espuma que se levantam com as ondas lembram-nos silhuetas de golfinhos ou de tartarugas ou de dugongos ou de baleias, que quem frequenta estas paragens diz já ter visto. Arregalamos os olhos ainda mais, como se a natureza já nos tivesse dado o que queríamos ver e apenas o nosso olhar falho nos impedisse. Mas a verdade é que precisaríamos de sorte. Depois de alguns quilómetros feitos de solavancos – a estrada de água também tem os seus buracos, uma tartaruga permite-se ver, mas por um momento fugaz, que é mais fácil fazer a fotografia com os olhos do que tentar com uma câmara fotográfica. Se há viagens que valem mais pelo caminho do que pelo destino, esta podia ter sido uma delas, se não fosse Bazaruto um caminho-destino que a cada movimento nos oferece novas imagens, como se fosse um caleidoscópio.

Bazaruto é um destino que a cada movimento nos oferece novas imagens.

A tarde já se faz alta. O primeiro dia será apenas de reconhecimento. Com a lua imperativa no céu e a agenda do dia seguinte posta à mesa, percebemos que entrar para Bazaruto pelo Anantara é abrir o portal para um parque natural de diversões.O Anantara Bazaruto Island Resort é a porta de entrada para a Ilha maior que dá nome ao arquipélago, com quase 33 km de comprimento e cerca de 5 km de largura, guardião de uma reserva faunística sem muitos paralelos no mundo. O facto de Bazaruto albergar a última população de dugongos das costas africanas é apenas um dos cartões-de-visita.

Mas a manhã seguinte chega fechada, com nuvens negras a negarem protagonismo ao astro-mor. O chão ainda húmido testemunha pela chuva caída pela madrugada, o que na tradição africana significa bênção, é, para nós, um mau agoiro. Se é verdade que as ilhas se fazem de terra cercada de mar, não é menos verdade que a presença do sol dá outra cor à terra e ao mar. Mas ainda assim, arriscamos a subida às dunas. Depois de um percurso de 30 minutos em terra batida a bordo de uma viatura 4×4, chegamos ao início da verdadeira viagem, que seria feita com os pés descalços. (É menos uma questão de tradição e mais de mobilidade). Pegadas vincadas pela humidade do terreno chamam-nos a atenção. “É cabrito vermelho” – diz-nos assertivo o guia. Ao longo do dia, ainda nos cruzaríamos com o “bicho” que se negou a ser domesticado e passeia livre e protegido pela floresta que agora é reserva.

Para a subida às dunas é preciso fôlego, o ar está húmido e o sol começa a esgueirar-se entre as nuvens. É como se escalássemos uma montanha. Quando chegamos ao cimo, estamos a 37 km da planície, com uma visão privilegiada do horizonte. Ver, aqui, o nascer e o pôr-do-sol é como se visualizássemos uma partida de ping-pong em câmara-lenta entre os deuses do norte e do sul.

Bazaruto alberga a última população de dugongos das costas africanas

Com o dia já completamente aberto, fazemos o passeio cultural pela comunidade. Lourenço Nhassengo, 51 anos a marcarem-lhe o rosto e toda uma vida vivida na Ilha, é o cicerone. É ele quem nos conta sobre as duas teorias da origem do nome da Ilha. Bazaruto já foi uswulutho, como os nativos a chamavam pela neblina escura que a caracterizava. Mas a pronúncia portuguesa tornou uswulutho em Bazaruto. Para outra teoria, o nome tem origem nas bazarutanas, conchas abundantes na Ilha. Teorias à parte, Bazaruto é uma experiência prática.

Nas margens da lagoa Mahungwé, erguem-se caniçais com ninhos de pássaros tecelão. As lagoas, que escondem crocodilos, acabam por ser um ponto preferencial das aves, sobretudo, migratórias. “Já foram aqui identificadas mais de 187 espécies de aves”, diz-nos Lourenço.

As comunidades surgem à medida que fazemos o caminho entre as árvores silvestres. As casas são circulares, feitas de palhas, em quintais separados uns dos outros, como se fossem também ilhas. À medida que ouvem o barulho do motor do carro que nos transporta, algumas crianças saem com sorrisos largos no rosto e as mãos erguidas em saudações. É a cordialidade que valeu à província de Inhambane o cognome “terra da boa gente”.

A ida à Ilha Santa Carolina, a bordo de uma lancha disponibilizada pelo Anantara, marca o início de tarde. A Ilha está toda ela transformada em ruína, escombros de um antigo hotel, mas também de uma antiga prisão de escravos, fazem com que o espaço rememore outros tempos, enquanto o mar bate nas rochas e nos deixa ver peixes coloridos, como se estivéssemos num aquário a céu aberto.

Depois de um dia intenso, no horizonte, o sol é lentamente engolido pelo mar, mais uma imagem deste caleidoscópio chamado Bazaruto.

Como ir

Voe com a LAM até Vilankulo. Marque uma reserva no Hotel Anantara, que já conta com o transporte de lancha de Vilankulo para Bazaruto.

▶ Onde dormir

A única estância hoteleira é o Anantara. Mas ao chegar perceberá que o Anantara não é apenas a única opção, mas a melhor opção.

▶ Onde comer

A cozinha do Anantara fornece uma variedade de pratos, profundamente marcados pelos ingredientes da terra e do mar.

▶ O que fazer

Ver o nascer ou o pôr-do-sol nas dunas. Fazer snorkeling nos corais pela diversidade da fauna marinha é uma experiência só ali repetível. Uma sessão no spa do hotel é relaxante. Santa Carolina é imperdível.

▶ Cuidados a ter

Chapéu, protector solar e água devem fazer parte do kit para escalar as dunas. Vista sempre roupas frescas. Não aproxime demasiado às lagoas, apesar das águas calmas, crocodilos estão à espreita. Ao fim do dia, lembre de colocar repelente contra insectos.

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