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Texto: Jaime Álvaro

Foto: Júlio Marcos

Edição 81 Out/Nov/ Dez| Download.

Uma aventura no sagrado monte Mabu

Já passava das sete horas, quando me reuni no ponto de partida com os restantes elementos do grupo (10), que incluía guias comunitários e líderes tradicionais, além do coordenador do projecto de criação de uma área de conservação comunitária em Mabu, engenheiro florestal António Serra, quadro da WWF.

Havíamos estado ontem à volta da fogueira e foi em conversa com os líderes tradicionais que percebemos que aquela montanha é respeitada e que uma escalada exige, além da capacidade física, muita coragem.

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A conversa descontraída à volta da fogueira serve essencialmente para conhecer a mística que está por trás do monte Mabu e visa igualmente esclarecer dúvidas ou curiosidades sobre o local. É nessa reunião informal que ficamos a saber das regras a serem seguidas no percurso até ao cimo da montanha.

O nosso caminho é feito à beira de precipícios verticais de fazer revirar os olhos. Há muitas rochas soltas que aumentam a nossa dificuldade na escalada, cursos de água nascem dos degelos. A elevada altura das árvores da extensa floresta escondem as nuvens e reduzem a claridade do dia, permitindo uma sensação estranha quanto mágica de estar no mesmo local de dia e de noite.

O grupo está entusiasmado. É a primeira vez que testa os seus limites e capacidade física e mental. Da minha parte não faltavam perguntas a fazer e do lado dos guias também não faltavam respostas a dar. O sr. Zeferino, 70 anos que lhe coreografam o passo, é o guia mais experiente e mais velho no grupo e a minha força de motivação sempre que o cansaço tentava sobrepor-se à bravura. As histórias que contava sobre o Mabu tornavam a dura caminhada num exercício prazeroso.

Estamos a caminhar a duas horas, num sobe desce vertiginoso entre rochas. “Estamos quase a chegar”, disse o líder tradicional que seguia conosco até ao ponto onde conduziria uma cerimónia para que a aventura corresse bem. Não conhecendo o lugar onde íamos, o mais sensato e conveniente foi acreditar.

Depois da cerimónia imprescindível e do descanso de meia hora, seguimos, agora sem o líder e a autoridade tradicionais, caminhando por mais três horas até ao primeiro acampamento. A nossa resistência foi duramente testada pelos obsctáculos. Além de escalar as rochas escorregadias, tínhamos a mata a bloquear-nos o caminho, que foi sendo feito pelos guias com recurso a catanas à medida do caminho.

As minhas sapatilhas de sola escorregadia aumentaram o grau de dificuldade nas subidas. Beijei o chão pelo menos três vezes e precisei de uma terceira perna, a bengala, que foi prontamente improvisada com um ramo para chegar ao acampamento.

O sol se ia por quando chegámos ao acampamento. A sensação foi de missão (quase) cumprida, pois estávamos a meio quilómetro da meta.

Já não era apenas com o cansaço que tinha de lidar, ou com a sola da sapatilha gasta, a fome também entrou na equação e multiplicou a tensão e o estresse. As pequenas pausas, não só serviram para enxugar o suor e hidratar o corpo, mas era o momento para se dar o testemunho sobre as experiências pessoais de cada um.

É verdade que as paradinhas quebram o ritmo. Mas também é verdade que são fundamentais para aguentar os derradeiros metros até ao cume do mítico Mabu com 1700 metros de altitude e uma área de cerca de 7880 hectares. A floresta do monte Mabu é considerada um dos maiores blocos contínuos de floresta tropical de média altitude na África Austral.

Acordamos cedo. Tomamos o pequeno almoço e seguimos viagem lentamente e orgulhosos da nossa força e determinação. Estamos perto de atingir um dos maiores desafios das nossas vidas, atingir o cimo de uma montanha.

Faltam pouco menos de 400 metros, e visto assim, pode até parecer pouco e fácil de escalar, mas o desafio era ainda maior e a dificuldade aumenta na medida que nos aproximamos da meta.

Estamos a 1700 metros de altitude do majestoso Mabu, a visão é de cortar a respiração, depois de um longo percurso de mais de seis horas ao longo do planalto, feito muitas vezes à força dos braços e com apoio da bengala improvisada.

A espiritualidade deste local é inegável. Cá do alto, perto das nuvens, sinto-me tão pequeno.

▶ COMO IR

Voe através da LAM até Quelimane e percorre cerca de 200 km até a sede do distrito de Lugela. É preciso contactar as autoridades locais e tradicionais para permitirem a entrada em Mabu.

▶ ONDE COMER

Não tem opção, se não carregar consigo os mantimentos próprios para se alimentar durante o acampamento. Não fique muito preocupado com o peso, os carregadores, que são imprescindíveis, ajudam no carregamento dos mantimentos. Recomenda-se abastecer em Mocuba, cidade mais próxima de Lugela.

▶ ONDE DORMIR

No acampamento. É seguro e a experiência vale a pena.

▶ O QUE FAZER

Desfrutar a aventura, a experiência e as paisagens surreais do majestoso e sagrado monte e aproveitar cada momento na floresta. Há muito ainda por se descobrir naquele espectáculo da natureza.

▶ DESTAQUE

O monte Mabu é o terceiro maior cume do país (1700 m), perde somente para o monte Binga (2436 m), na província de Manica, e Namuli (2420 m), localizado na província da Zambézia.

Edição 81 Out/Nov/ Dez| Download.

 

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