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Texto: Cristiana Pereira

Foto: Mauro Pinto

Edição 71 Jan/Fev | Download.

Rosas bravas – “As flores não esperam”

Isabel Tembe consegue distinguir a cor das rosas de olhos fechados – basta-lhe sentir o perfume: a suavidade da cor de salmão, a doçura da cor de rosa ou a intensidade da amarela. A sua sensibilidade e também o seu gosto foram evoluindo com o tempo. Com o passar dos anos, ficou a conhecer melhor a característica de cada variedade – e não há duas iguais. “No princípio, gostava mais da vermelha porque era a que tinha mais no mercado; mas aos poucos fui-me apaixonando pela cor de rosa. Pões na sala e, basta passares, sentes logo aquele perfume”.

Estamos no bairro das Mahotas, na periferia de Maputo, num terreno de dois hectares e meio, onde árvores nativas crescem pujantemente como numa reserva da natureza. Penetramos o mato até chegar a uma clareira onde encontramos filas de roseiras bravas de diversas cores, plantadas em sacos de plástico pretos (mais tarde explicam-nos que o plantio em sacos, em vez de directamente na terra, torna o consumo de água para rega mais eficiente).

Esta é uma das poucas produções nacionais de rosas que Moçambique tem e é fruto de um longo exercício de paciência. Juan Estrada, sócio de Isabel, relata-nos o histórico desta aventura, enquanto passeamos entre as plantas. A primeira semente foi lançada à terra há 20 anos, mas foi só em 2010 que a produção ganhou mais foco. Foi nessa altura que, juntamente com o primeiro sócio, Francisco António Macaringue, adquiriram três variedades de planta brava num pequeno roseiral do Instituto de Investigação Agrária de Moçambique, em Boane.

“As flores não esperam”, diz Juan Estrada. Tal como na vida, perante obstáculos e adversidades, é preciso seguir em frente.

“A rosa dá vida! Nem que estejas mal disposta, basta sentir aquele perfume e ficas logo melhor”, diz Isabel Tembe.

Os anos que se seguiram trouxeram inúmeras barreiras para testar a sua determinação. O falecimento do sócio, em 2013, levou à paralisação do projecto durante mais de um ano. Quando, no final desse período, decidiram relançar a actividade, Juan ficou incrédulo: depois de desmatar o terreno, descobriu que tinham resistido 300 pés. Talvez por isso a sua dedicação ao projecto seja inabalável. Enfrentaram períodos de seca, crises de água, um incêndio que destruiu uma grande parte da produção, mas recusa-se a desistir. Se alguma coisa aprendeu ao longo deste tempo é que “as flores não esperam” – tal como na vida, perante obstáculos e adversidades, é preciso seguir em frente.

Hoje, Isabel e Juan têm cerca de 800 pés que geram uma média de 80 a 100 flores por dia. A meta para este ano é chegar aos 2000 pés enxertados, dos quais cerca de um quarto será para jardins e o restante para venda em ramo.

No entanto, a maior batalha que Isabel e Juan travam é provavelmente o próprio mercado que habituou os consumidores à rosa vermelha de importação. O dia mais forte em termos de comercialização é fácil de adivinhar: o de São Valentim, assinalado a 14 de Fevereiro. Nas bancas de vendedores ambulantes ou nas lojas de postais, a imagem da rosa vermelha carnuda tornou-se cliché. Mas, tal como acontece com a fruta de produção industrial – que até pode ter uma aparência perfeita -, basta senti-la para perceber que não tem aroma nem gosto.

Mas não é às massas que Isabel e Juan querem chegar. Entendem que o perfil de cliente para as suas rosas bravas é de nicho: prefere o cultivo orgânico ao industrial; a imperfeição do produto biológico à perfeição da produção em massa. E assim aos poucos, com muita persistência, vão garantindo um fluxo constante de clientes regulares que todas as semanas recebem em casa uma explosão de cor e aroma. “A rosa dá vida! Nem que estejas mal disposta, basta sentir aquele perfume e ficas logo melhor, parece que alegra!”, diz Isabel. E acrescenta: “Mesmo depois da flor secar, as pétalas ainda mantêm o seu perfume. É por isso que tenho sempre rosas em casa em todos os cantos – até no banheiro!”

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