Maheu – O peso de um prato
As labaredas espraiavam-se em volta da grande panela com a cor de fumaça. A papa fervia na lenha do mundo. E depois se seguiriam os dois dias encostados à escuridão do armazém solitário do fundo de quintal. A espera que se confundia com o esquecimento, o grande exercício de paciência.
Ao terceiro dia, o cheiro em agulha da papa fermentada, lançado pelo vento, invadia a casa. Era hora então de fazer correr a cascata castanha do açúcar para entranhar-se no moinho gerado pela grande colher em madeira na coreografia das mamanas dos braços grandes.
E os copos cheios para o ritual com o gole da densidade do mundo a acompanhar os kulungwanas com os noivos a atravessarem a porta dos ramos de palmeiras entrançadas que só cairiam de secas. E só depois seria o almoço. E quem comeria muito mais a seguir àquele primeiro copo com o peso de um prato?
Mas o maheu deixou de ser apenas a bebida de casamento para se celebrizar nas mãos dos homens de força. E todos os meninos querem ser homens de força. Então passávamos a deixar as últimas moedas do lanche para as pequenas bilhas na saída da escola.
O ritual de despedida, de partilha da alegria, quando não tínhamos ainda o sentimento de mundo grave, como diria Luís Carlos Patraquim. E depois os ralhetes dos pais por sempre deixarmos o jantar a meio.
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